Arte Observada – Beatriz Milhazes

Nossa colunista Milenna Saraiva fala sobre a carreira da artista carioca e analisa a obra Mulatinho, de 2008

Beatriz Ferreira Milhazes nasceu no Rio de Janeiro, em 1960, onde ainda reside e trabalha. Em 1981, formou-se em Comunicação Social pela Faculdade Hélio Alonso, mas antes, mesmo, de concluir o curso de comunicadora social, passou a frequentar artes plásticas na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, onde passou a lecionar alguns anos depois.

Em 1984, aos 24 anos, participou do importante movimento artístico Como Vai Você, Geração 80?, em que mais de 100 artistas questionaram a ditadura militar por meio de seus trabalhos. No decorrer dos anos, participou de inúmeras exposições, nacionais e internacionais, Bienais em São Paulo e Veneza. Suas obras fazem parte de importantes acervos de museus mundo afora.

Suas obras da década de 1980 revelam uma tensão entre figura e fundo, entre representação e ornamentalismo. Posteriormente, faz opção por uma pintura de caráter decididamente bidimensional. Em trabalhos mais recentes utiliza, constantemente, formas como círculos, estrelas e espirais; as cores tornam-se mais luminosas, sugerindo deslocamentos ora concêntricos, ora expansivos.

A artista desenvolveu uma técnica única que utiliza na maioria dos seus trabalhos: prepara imagens sobre plástico transparente, que são descoladas como películas e aplicadas na tela por decalque. Aglomera as imagens preenchendo o fundo e retocando a imagem final. A transferência das imagens da superfície lisa para a tela faz com que a gestualidade seja quase totalmente anulada. Além desta técnica, ela também abusa das colagens que recebem a interferência de seus pincéis.

Sua obra O Mágico, pintada em 2001, foi vendida em um leilão da Sotheby’s, em Nova York (2009), por cerca de 1,6 milhão de reais; sua tela O Moderno foi comprada em Londres, por 1,8 milhão de reais pela Phillips de Pury & Company. E, em 2012, a obra Meu Limão foi vendida por 2 milhões de dólares na Galeria Sotheby’s. Tais façanhas a tornaram grande expoente da arte contemporânea brasileira.

A obra Mulatinho revela a influência de trabalhos desenvolvidos pela artista, a partir de 2003, com a retomada das colagens de papéis industrializados e as referências que realizou a partir de 2004 nos espaços institucionais de arte, com instalações e trabalhos em fachadas.

A obra de Milhazes tem grande inspiração no Carnaval, com seu visual, atmosfera, loucura e beleza. Ao contrário de Hélio Oiticica, que também trouxe referências do Carnaval para o seu trabalho, ela jamais fez parte do mundo do samba ou do Carnaval. Beatriz é uma carnavalesca conceitual.

O trânsito entre as linguagens plásticas expressivas com a pintura, a colagem e a gravura é uma constante em toda a sua produção. Desta vez ela agrega novos materiais introduzindo, também, elementos do espaço tridimensional da arquitetura.

As linhas dos espaços arquitetônicos são incorporadas e criam espacialidades mutantes. Elas se aproximam e se distanciam, interpenetram-se e coexistem em um mesmo plano que, virtualmente no momento da contemplação, não é mais bidimensional.

As formas parecem eleger as cores, e as cores parecem eleger as formas. Juntas constroem a unidade e a identidade da pintura. O olhar do espectador é levado a percorrer todas as imagens, acompanhando a exuberância gráfica e cromática presente.

Esta obra de formato quadrado, composta de blocos cromáticos igualmente quadrados, dos menores aos maiores, sobrepostos e justapostos, em diálogo com os círculos, cria uma nova espacialidade.

A curiosa silhueta escura e vazada, que se destaca na pintura, abre-se para outros espaços, assim como o círculo acima e à direita. Entre as idas e vindas das formas, cria-se um ritmo. Aliando-se à música, ao samba, ao carioca, o título Mulatinho dá o tom, a nota que faltava.

Neste mundo sem fronteiras, a arte precisa ter um “sotaque” regional, e isso a obra de Beatriz tem de sobra.


Vamos Observar:

Mulatinho, 2008

248 x 248 cm

Acrílica sobre tela

Coleção particular


Por Milenna Saraiva, artista plástica e galerista, formada pelo Santa Monica College, em Los Angeles.

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