Educadores articulam possíveis caminhos para um contexto pós-pandemia, repensando a utilização de tecnologias, metodologias pedagógicas, relações socioemocionais, aproximações entre escola e família e, sobretudo, a construção de pautas coletivas. Esse texto traz reflexões de educadores e instituições de ensino da região sobre este novo momento, propondo estratégias para pensarmos e construirmos um espaço educacional que seja possível de ser trilhado por todos que compõem a escola, tornando-a singular e potente.
Inquietos e ansiosos, comportamento de alunos em sala de aula é desafio. Como o lidar com isso?
Ficamos, praticamente, dois anos em um canto com pouca ou nenhuma luz do sol. A iluminação por led de um monitor ofuscou o prisma de cores que a presencialidade nos permite. A interação, quando havia, dava-se por uma mão virtualmente levantada, uma frase no chat e, quando muito, um microfone aberto. A escola, espaço das relações interpessoais e da convivência coletiva, estava vazia, esperando o retorno salutar do movimento e o som vivaz das pessoas. No retorno, encontramos uma escola que não reconhecemos, pois não somos mais os mesmos. Como não ter alunos inquietos e ansiosos? É necessário que haja escuta, retomada dos combinados da rotina, ações diferentes para esta nova convivência. Assim, no Colégio Rio Branco, trouxemos para alunos e famílias, um novo pacto pedagógico, que traz aspectos importantes, como a presença efetiva, o desenvolvimento do foco atencional dos alunos, a desconexão para a conexão. Estabelecer o diálogo, olhar atentamente, escutar ativamente, compartilhar as expectativas, demonstrar segurança e, ao mesmo tempo, flexibilizar se fez necessário nesta nova escola, que nos apresentou novos desafios, mas que se mantém pulsante e repleta de oportunidades.
Claudia Xavier, diretora da Unidade Granja Vianna do Colégio Rio Branco
Além do espaço físico e dos equipamentos tecnológicos, talvez a maior mudança seja na abordagem do ensino. E, mais do que nunca, o papel do educador é fundamental. Concorda?
A ação docente possui uma importância fundamental na estrutura de uma sociedade. Os educadores, através dela, formam e influenciam sujeitos co-participantes desta prática. Neste mundo contemporâneo, cada vez mais, percebemos que a educação se dá em diferentes territórios e que o processo de aprender não é mais estático e imutável/rígido. Convivemos com o crescimento e o desenvolvimento de uma sociedade em rede, pulsante e viva, refletida nas ações de nossos alunos. Sendo assim, ser Educador pressupõe ter, além da incessante busca pelo conhecimento, a inquietação de aumentar sua capacidade de inovar, de ousar e de dar mais sentido e contexto a sua ação educativa.
Ana Beatriz Assali, coordenadora dos 8º e 9º anos do Ensino Fundamental II e Ensino Médio do Colégio Giusto Zonzini
As novas pesquisas educacionais apontam para a aprendizagem colaborativa. Como trabalhar esse novo coletivo escolar?
A aprendizagem colaborativa possibilita o desenvolvimento de habilidades muito importantes para a vida adulta, como criatividade, liderança, capacidade de argumentação, resiliência e flexibilidade. No entanto, para que o trabalho seja efetivo, não basta propor que a tarefa seja desenvolvida em grupo, é necessário que o educador planeje a atividade cuidadosamente. É importante estabelecer estratégias que desenvolvam as habilidades relacionadas à organização e o estabelecimento de normas mínimas de conduta, à orientação dos esforços para a realização das tarefas e à manutenção de relações voltadas à eficácia de trabalho, à facilitação dos processos psíquicos para propiciar o uso de estratégias superiores de raciocínio, bem como o domínio e a retenção dos conteúdos; e, por fim, à fomentação de conflitos sociocognitivos que auxiliem no aprofundamento da reflexão. A formação de agrupamentos diversos (duplas, trios, aulas dialogadas com toda a turma), propostas de monitoria entre pares (peer instruction) são algumas estratégias que também possibilitam a aprendizagem colaborativa. No limite, a cultura de colaboração – a ajuda recíproca, o apoio mútuo, o incentivo dos esforços para que todos os membros do grupo aprendam, o intercâmbio de opiniões, estratégias e recursos e a confiança mútua – deve permear todos os momentos do trabalho pedagógico, mesmo aqueles em que não há uma proposta de “produção em grupo”.
Giselle Maria Magnossão V. De Carvalho, diretora pedagógica do Colégio Albert Sabin
O modelo tradicional de sala de aula, com carteiras separadas por filas e o professor à frente de uma lousa, não favorece o dinamismo necessário para a Educação 4.0. O que o futuro nos reserva?
A educação 4.0 traz muito fortemente a convergência de tecnologias, o uso de dispositivos e plataformas, impressão 3D, inteligência artificial, automação, sistemas robotizados, entre outros. Tudo isso transforma o modo como pensamos, nos comportamos e absorvemos o conhecimento. Em um futuro próximo, instituições de ensino se organizarão de forma a responder à nova configuração da educação 4.0 com ambientes que contemplem e estimulem a autonomia, a criatividade, a solidariedade, a pesquisa, a resolução de problemas, a cultura maker, entre outras habilidades, a fim de tornar os estudantes protagonistas da construção de seu conhecimento. Com foco nesse cenário, educadores, com conhecimento teórico tecnológico, atuarão como mediadores.
Suely Nercessian Corradini, diretora pedagógica do Colégio Vital Brasil
A educação infantil talvez sido a mais impactada nos últimos tempos, pois as atividades lúdicas e em grupo eram dominantes nas salas de aula até o início da pandemia. Como encontrar a medida correta para manter um ambiente acolhedor e com aprendizado cognitivo integrado?
As escolas de educação infantil estão em busca de um ambiente que visa recuperar o tempo perdido durante a pandemia. É preciso que entendam que os conteúdos pedagógicos foram dos prejuízos, o menor, se faz necessário o entendimento que nessa faixa etária a primeira porta para o aprender é o brincar, e as crianças aprendem melhor em pares, ou seja, interagindo com outras crianças. É preciso que busquem ambientes saudáveis e acolhedores, tirando o medo e a insegurança de crianças e responsáveis, pois quando conseguirmos que nossos alunos voltem a brincar e interagir como antes, o prejuízo pedagógico será muito mais fácil de sanarmos.
Sandra Cristina Mirisola Pires, diretora administrativa da Escola Doce Geração
O futuro já começou e nos exige uma abertura muito grande para a inovação e a mudança. Estamos todos convidados a inaugurar uma nova era. O que será da educação daqui em diante?
Muitos especialistas em Educação concordam que a pandemia fez com que um processo que levaria ainda mais de 10 anos entrasse definitivamente na rotina de aprendizagem – a tecnologia! Ela veio para ficar e nunca mais sair, pois quando o EAD começou a fazer parte da rotina dos estudantes e docentes, a curva de aprendizagem foi acelerada, e as tecnologias educacionais, aprimoradas, já que foi possível testar diferentes ferramentas: desde como acessar os estudantes e engajar para promover aprendizagem a eles até como medir sua eficiência e eficácia na prática escolar. No entanto, não podemos deixar de apontar a fragilidade do nosso país quanto a este tema, já que o acesso às redes de internet não é feito de forma equitativa. Não dá para falar em inovação e mudança sem citar a precariedade e a vulnerabilidade que ainda vivemos no tocante à educação. Pauta essa que inquieta e mobiliza pesquisadores da área, tendo em vista que a educação brasileira ainda desponta nos rankings negativamente, como o PISA (exame internacional). Porém, é importante ressaltar que estudos como a neurociência têm ajudado muito, assim como pesquisas sobre soft skills. O desafio será não colocar estes estudos profundos e necessários na prateleira do “modismo”, mas sim na entrada assertiva de pesquisas acadêmicas e da ciência como balizadores de decisões na educação básica. Isso sim será inovação e uma grande mudança!
Claudia Siqueira, diretora do Colégio Sidarta
Apesar do estudante ganhar protagonismo e autonomia, o professor não perde sua importância. Qual é o papel dele no cenário atual?
Professores e estudantes convivem no mesmo ambiente com papéis que se estabelecem na interdependência de ações: aprender e ensinar mutuamente. Tal processo de aprendizagem se dá pela relação entre ambos. Na experiência escolar do “novo Ensino Médio”, as aprendizagens se alicerçam nas trocas de conhecimentos embasadas nos conceitos pedagógicos trazidos pelos professores alinhados aos desejos de aprendizagens dos estudantes. O protagonismo se faz aí, pela curiosidade e pelo desejo de aprendizagem. E é professor quem medeia a relação expondo, para tanto, a sua função de ser, que é cada vez mais fundamental no processo da formação social. No protagonismo dos estudantes, cabe ao professor se colocar como referência de valores, condutas e conhecimentos, na direção dos seus anseios e da sociedade.
Marcio Macarini, orientador educacional da Escola Granja Vianna
Hoje, o modelo educacional vigente precisa levar em conta os modos como as pessoas aprendem. Se os conteúdos necessitam fazer sentido para os estudantes, que mudanças precisam ser implementadas?
O mundo está conectado e as informações percorrem de forma absurdamente rápida pela internet. Em função dessa conectividade e universo on-line, a escola tem se inserido cada vez mais em metodologias digitais, para que possa utilizar a tecnologia como facilitadora da aprendizagem escolar. Para fazer sentido e transformar os alunos em espectadores ativos interessados nas aulas, a tecnologia inovou a forma de aprendizagem, tornando possível o desejo do aluno em aprender ao se aproximar de seu universo de interesse. Pensando nessa nova realidade, utilizamos uma plataforma educacional linkada à metodologia de ensino, que oferece recursos digitais como: aulas gravadas; vídeos interativos; jogos pedagógicos; recursos que se aproximam à realidade e interesse dos alunos, tornando a aprendizagem possível.
Cíntia Lang, Coordenadora Pedagógica do Colégio Desafio
Qual é a importância do espaço escolar e presença física para o aprendizado?
A escola é a porta de entrada na sociedade. No ambiente escolar, as regras e acordos precisam levar em conta um todo muito mais amplo do que a família e, assim, exercícios democráticos são praticados constantemente. O desenvolvimento das competências – importante capacidade de mobilização de recursos-, só se constrói na relação com o outro, sendo a escola o local desse encontro. Estar presente fisicamente é imprescindível, especialmente na infância, pois o aprendizado se constrói pela exploração e investigação e, quando todos os sentidos estão envolvidos no processo, essa aprendizagem se torna relevante. Um ambiente planejado e atraente tem o poder de oferecer mudanças, promover escolhas e encontros e um enorme potencial para estimular a aprendizagem social, cognitiva e emocional.
Gabriela Lourenço, assessora da Escola Sementes do Alecrim
No novo cenário, professores e alunos são desafiados a estimular a solução de problemas complexos de forma compartilhada e cooperativa. Os modelos pedagógicos vão, necessariamente, incluir o desenvolvimento dessas competências?
Acredito que a educação tem evoluído de maneira positiva ano após ano. Os modelos pedagógicos bem aplicados têm condições reais de acompanhar a evolução do discente. O trabalho direção – coordenação – docente precisa ser atualizado para que o aluno tenha sempre o melhor daquilo que é proposto. Não existe Educação sem processos e acompanhar as novas metodologias são essenciais para o sucesso. A pandemia veio para reforçar que, sem mudança, não se chegará a lugar algum. Aqueles projetos antes parados, tomam formas lindas para que o processo de ensino-aprendizagem aconteça e atinja todas as diferentes mentes pensantes.
Denis Franceschinelli, diretor-administrativo do Colégio Samarah
A escola e a prática pedagógica precisam ser inclusivas, devendo levar em conta as reais necessidades dos alunos. Como contextualizá-las e considerar os estilos de aprendizagem de cada aluno?
As reflexões deste período tiveram grande repercussão nas formações de professores, como por exemplo, a confirmação de processos que já existiam, como a abordagem baseada em projetos. Este trabalho evidencia a inovação às práticas da sala de aula, sobretudo às inclusivas para que possam contribuir com o desenvolvimento e adaptação das crianças, levando em conta que a aprendizagem é única e diferente para cada ser humano. Assim, um ensino significativo propõe um percurso metodológico com ênfase no propósito. Para os alunos, uma proposta baseada em projetos, pois permite que desenvolvam habilidades, criem ideias a partir de seus interesses em um ambiente lúdico e colaborativo. Para o docente, um processo metodológico que o oriente ajudando na revisão de suas ações, provocando mudanças em favor de projetar novos caminhos, organizar o cotidiano e contribuindo para a orientação de diferentes olhares em relação aos percursos das crianças.
Maria Júlia de Oliveira Dias, coordenadora pedagógica da Escola Bosque das Letras