Prolongando a saideira

Comerciantes de Cotia se mobilizam para alterar lei que obriga bares e restaurantes a fechar suas portas até às 23 horas.

O silêncio nos estabelecimentos está tirando o sono dos proprietários de bares e restaurantes de Cotia. Para ser mais claro, o motivo de preocupação desses comerciantes tem número e apelido. A Lei nº 1334, conhecida por “Lei Seca”, que regulamenta o horário de funcionamento de bares e restaurantes de Cotia, tem prejudicado o funcionamento e o faturamento dos empresários. Em alguns estabelecimentos, a queda no faturamento já chegou a 70%.

Este é o caso do boteco Do Leme ao Pontal, localizado no bairro do São Paulo II, que de acordo com o sócio-proprietário Cacau viu seus clientes migrar para estabelecimentos de cidades vizinhas, onde as leis que regulamentam os horários de silêncio são mais flexíveis. “As regras que regulamentam a Lei Seca são muito rígidas e a fiscalização chega a ser truculenta, isto quando as multas por infração são apenas passadas por baixo da porta, sem prévia notificação”, comenta. Cacau, junto com outros comerciantes, procura formas de flexibilizar a lei, negociando com o Poder Público uma emenda.

O comerciante Marcos Mello, do Restaurante Família Mello, sempre fechou o seu estabelecimento às 23h, porém, ainda assim, recebeu uma multa. Para evitar novas multas, não deu outra: passou a fechar ainda mais cedo, por volta das 22h30, e continuar atendendo apenas os clientes que estão dentro da casa.

Assim como Cacau, Marcos diz que não entende o porquê da fiscalização não notificar antes de multar. “Se o fiscal viu o estabelecimento aberto para realizar a multa, por que não entrou para notificar a infração?”, questiona.

Além da questão do fechamento, muitos estabelecimentos também estão se adequando às outras regras exigidas pela lei, como isolamento acústico, estacionamento e funcionários destinados à segurança especializados, inscritos e autorizados pelos órgãos competentes da segurança pública.

Preferindo não se identificar por temer represálias, o proprietário de um estabelecimento localizado na Estrada Fernando Nobre comentou que seu faturamento caiu 38% e, por causa da aplicação da Lei de 2005 teve de pegar dinheiro emprestado no banco para instalar isolamento acústico e contratar seguranças. “Minha casa funciona há nove anos, e nunca recebi uma única reclamação por excesso de volume. Apesar de não ter residências próximas, estou implantando isolamento acústico, reestruturando o estacionamento e contratando segurança. Isto tudo sem saber se terei retorno e conseguirei reconquistar a clientela que migrou para outras cidades”, afirma.

Jorge Fernando Pereira de Carvalho, sócio-proprietário da Água Doce Cachaçaria, localizada na Rua José Félix de Oliveira, também investiu pesado para instalar isolamento acústico na casa, desembolsando 80 mil reais, além da contratação de uma empresa para emitir dois laudos certificando a obra, um com música ao vivo e outro apenas com som ambiente. Para Jorge, que emprega direta e indiretamente até 80 funcionários, a despesa pesou no bolso em um momento que, por causa do horário de fechamento previsto em lei, o movimento caiu 50%.

Além da reunião realizada pelo Centro de Apoio ao Empreendedor de São Paulo (CAE-SP), que divulgamos na edição passada, mais duas reuniões foram realizadas e algumas soluções estão sendo desenhadas, ao menos por parte dos comerciantes.

 

Ressaca

Conservar a ordem e o bem-estar dos cidadãos é um dever do poder público, mas a arte de bem administrar e legislar está em fazer isso de forma que o crescimento econômico e a sustentabilidade sejam viáveis. Como forma de viabilizar o retorno do público consumidor à região, sem incômodo para a vizinhança, foi proposta uma emenda ao Legislativo com alguns pontos que poderiam reaquecer o movimento em bares e restaurantes.

O primeiro deles é que bares e restaurantes possam estender seus horários até às 2h, com som ambiente. E até às23h, música ao vivo.

Outro ponto é a notificação dos estabelecimentos infratores antes da aplicação da multa, para que estes comércios possam regularizar sua situação. E, por fim, que a fiscalização seja realizada por profissionais capacitados, com qualificação direcionada à área.

Quando a pauta deve entrar em votação na Câmara Municipal de Cotia? O presidente da Casa, Paulinho Lenha (PSB), diz que já conversou com o Executivo sobre o assunto, mas aguarda o texto para apreciação do Legislativo. “Já conversei com o prefeito e com os secretários de Indústria e Comércio e de Segurança, que apontaram que a proposta de emenda contempla as mudanças de horários de funcionamento às quintas, sextas e sábados, com horários estendidos até às 2h, e os outros dias da semana o horário de 23h para que o fechamento seja mantido”, explica.

Sobre a reivindicação da contratação de profissionais capacitados para fiscalizar os estabelecimentos, Paulinho disse que a Guarda Civil Municipal recebeu o treinamento e estão providos de equipamentos para aferição do som produzido no comércio.

 

O outro lado

A Prefeitura de Cotia se defende, afirmando que foram registradas, de janeiro a maio de 2017, quase 200 denúncias de cidadãos incomodados com barulho, perturbação do sossego, carros estacionados em locais proibidos e brigas relacionadas ao consumo de álcool e drogas durante a madrugada. A fim de atender as reivindicações desses moradores e as solicitações do Judiciário, a Secretaria Municipal de Segurança Pública e a Secretaria de Indústria e Comércio se uniram e iniciaram um trabalho de fiscalização na cidade para orientar os comerciantes que atuam no período noturno. Com essa ação, a Prefeitura diz que o número de reclamações por barulho e perturbação do sossego reduziu consideravelmente nos últimos meses. E que “tem trabalhado no sentido de auxiliar os comerciantes que querem se adequar à legislação para funcionar após 23 horas, está aberta ao diálogo e se mantém à disposição dos empresários e da população para esclarecer todas as dúvidas em relação ao tema”, informa em nota.

 

Parem a música

O artigo 1º da Lei nº 1334, de 19 de maio de 2005 diz que os bares e estabelecimentos similares localizados no município não poderão funcionar após às 23h, tendo o horário previsto para o início de suas atividades fixado a critério próprio, não antes das 5h.

De acordo com a legislação municipal, para ter o alvará após às 23 horas, é necessário que a casa siga critérios como aplicação de isolamento acústico, apresentação de laudo, disponibilização de estacionamento para a clientela e garantia da segurança – inscritos e autorizados pelos órgãos competentes da segurança – dos frequentadores do local.

As penalidades vão de multa de valor equivalente a dois salários mínimos, na primeira autuação; multa de valor equivalente a quatro salários mínimos na segunda autuação e fechamento administrativo com a lacração de todas as entradas na terceira autuação.

O segundo parágrafo, do artigo segundo, diz que a Guarda Civil Municipal, além dos órgãos já incumbidos de fiscalização, também é competente para exercer a fiscalização pelo cumprimento das determinações desta lei.

 

Toca Raul

Os comerciantes querem que os bares e estabelecimentos similares localizados no município estendam o horário de funcionamento: até às 23h com apresentações musicais e até às 2h com música ambiente. Também pedem que as notificações de irregularidades sejam feitas antes da aplicação da multa, como acontece em infrações de trânsito, e que a fiscalização seja realizada por profissionais capacitados, com qualificação direcionada à área.


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