A artista francesa Élisabeth-Louise Vigée-Le Brun nasceu em Paris, em 1755. Élisabeth era filha de Louis Vigée, um retratista famoso, que a ensinou a pintar. Naquela época, era impensável para qualquer mulher estudar na Academia de Belas Artes ou trabalhar com modelos vivos. Élisabeth foi a primeira a fazê-lo.
Como seu padrasto confiscou sua renda, ela sobreviveu, desde a adolescência, da venda de suas obras. Mas, de acordo com a lei, os artistas deveriam pertencer a uma corporação, e assim que as atividades ilegais de Le Brun foram descobertas, seu estúdio foi fechado pelas autoridades.
Por isso ela teve de tentar uma vaga na Académie de Saint-Luc, que a aceitou. Apesar dos seus 20 anos, a jovem já tinha uma grande quantidade de clientes.
Ficou conhecida por retratá-los de forma generosa, com cores alegres, em estilo Neoclássico e por exaltar ideais de simplicidade e pureza. Seu trabalho também pode ser considerado Rococó por sua graça, delicadeza e naturalismo.
Apesar de viver em uma época bastante turbulenta de pré-Revolução Francesa, sua fama se espalhou pela Europa e chegou ao Palácio de Versalhes, sede da monarquia. A rainha Marie Antoinette procurava um novo pintor que conseguisse disfarçar certos traços do seu rosto e seu famoso queixo proeminente.
Em outubro de 1789, quando uma multidão invadiu Versalhes e trouxe o rei e a família real de volta a Paris, Le Brun percebeu que aquele mundo que ela tanto lutara para vencer estava desmoronando.
Fugiu, então, para a Itália com sua filha, Julie, e uma governanta, deixando o marido para trás. Em exílio, ficou sabendo das últimas novidades da revolução: a queda da monarquia, a morte de Luís XVI e, finalmente, a execução de sua patrona. Nos anos em que passou fora, sua carreira continuou a prosperar.
Muitos dos seus antigos clientes continuaram a encomendar seus trabalhos, permitindo que Élisabeth garantisse a renda necessária para seu próprio sustento e o da filha.
Nos anos seguintes, viajou por quase toda a Europa e, aos 87 anos, faleceu em sua residência em Louveciennes, França.
Retratar a rainha Marie Antoinette não era tarefa fácil. Em razão da alvura de sua pele, muitos pintores sentiam dificuldade em encontrar uma pose para a modelo que deixasse transparecer com exatidão os seus traços fortes.
Élisabeth, contudo, descobriu uma fórmula ideal para isso ao elaborar três poses diferenciadas para a rainha, que lhe permitiam captar sua aparência e disfarçar as imperfeições. Antoinette não só aprovou o trabalho da artista, como também a patrocinou.
Em pouco tempo, Le Brun seria contratada por outras tantas nobres para pintar seus retratos.
Entre elas estavam a amiga de Marie, a duquesa de Polignac e membros da família real.
Com o apoio da monarquia francesa, a artista conseguiu uma vaga na disputada Academia Royal de Pintura e Escultura, tornando-se uma das quatorze mulheres lá admitidas, junto a 550 artistas.
No primeiro Salão de Artes do Louvre, ela exibiu alguns retratos, incluindo La Reine en Gaulle. A obra, apesar de admirada por sua execução, foi removida da exposição por ser considerada obscena e imprópria para a época.
A rainha foi uma das mulheres que mais posaram para pintores na sua época. Em muitos de seus retratos, a vemos cercada por diversos símbolos monárquicos, uma vez que, como rainha do primeiro trono da Europa, a imagem da soberania francesa deveria estar bem representada em tais quadros.
No entanto, cansada de toda a etiqueta da corte de Versalhes, ela resolveu posar usando apenas uma camisola branca, um chapéu de palha e segurando nas mãos uma rosa.
A simplicidade do vestuário escolhido para essa obra foi um contraste com as tradições de vestuários nos quais a realeza sempre foi retratada.
Marie Antoinette era conhecida por desafiar tradições e quebrar protocolos na época, mas ser pintada em vestimentas que eram consideradas lingerie foi considerado vulgar.
Esse retrato serviu, também, como propaganda política. A rainha, que cada vez mais passava seu tempo no seu palacete, o Petit Trianon, provocava a indignação do povo, que não a via com bons olhos por seus hábitos excêntricos, vestuários caríssimos e o uso excessivo de joias, enquanto a França passava por uma de suas maiores crises econômicas.
Élisabeth foi pioneira em muitas coisas. Ela abriu espaço para as mulheres artistas de seu tempo e provou que o talento artístico não era uma característica exclusiva dos homens. Sua obra pode ser comparada às dos maiores mestres consagrados pela História.
Hoje, apesar de por muito tempo ter vivido nas sombras do esquecimento coletivo, consequência do machismo predominante no mundo da arte, é reconhecida como uma das artistas mais importantes de todos os tempos.
Élisabeth é, com certeza, a retratista mulher mais famosa do século XVIII. Em fevereiro de 2016, a artista ganhou sua primeira retrospectiva no museu The Met, em Nova York. Vigée-Le Brun deixou um legado de 660 retratos e 200 paisagens. Seus trabalhos podem ser encontrados em grandes museus, como o Museu Hermitage, a Galeria Nacional de Londres, o Museu do Louvre e a National Gallery of Art.
Por Milenna Saraiva, artista plástica e galerista, formada pelo Santa Monica College, em Los Angeles.