Resolvi trocar o meu possante por um carro zero-quilômetro. Escolhi três modelos de marcas diferentes, todos da mesma categoria. Concorrentes entre si e com características e preços parecidos. Fui, inicialmente, a uma concessionária Ford. O atendimento foi bom, avaliaram meu veículo por um preço justo e me passaram o preço do carro pelo qual eu estava interessado. Como o valor era R$ 2.000,00 acima do preço dos concorrentes, questionei e recebi a seguinte explicação:
– O nosso já é ano 2018! E o dos concorrentes é 2017!
– Que bom, disse! E qual é a diferença no carro?
– Nenhuma, mas no certificado vem o ano 2018, e isso valoriza o veículo.
Agradeci e fui em frente na minha pesquisa. Procurei uma concessionária Chevrolet/GM. O vendedor que me atendeu explicou as belezas de um modelo que eu não queria comprar e, finalmente, passou-me o preço do modelo por mim escolhido. Em seguida, foi avaliar meu carro, que entraria na troca. Voltou com um ar desolado e me disse que, infelizmente, não poderia aceitar o meu carro na troca. Surpreso, indaguei-lhe o porquê, já que o meu carro era da marca Chevrolet/GM, justamente a mesma marca do carro que ele estava vendendo e a Ford, marca concorrente, avaliou e aceitou o mesmo carro no caso de compra!
– É política da empresa. Pelo ano e modelo do carro não podemos aceitar.
Hã? Inacreditável!
– Ok, disse-lhe, é minha política não comprar carros de marcas que não aceitam seus próprios carros na troca. Decidido a jamais comprar um carro da marca, descartei a GM e fui à Hyundai. Tentei em duas concessionárias, e descobri que lá eles não vendiam o modelo que eu queria. Na terceira tentativa, achei uma CAOA com o modelo. Ufa! Entrei na loja e não vi nenhum vendedor. Depois de alguns minutos, localizei uma moça falando ao celular. Eu me dirigi a ela, que, com ar de “você está me atrapalhando”, declarou:
– É hora do almoço e os vendedores foram almoçar. Espere naquela sala. Virou-se e continuou o animado papo no celular. Pensei com meus botões que era exatamente por ser hora do almoço que eu estava ali, pois em outro horário não poderia estar. Será que eles não pensaram nisso? Acho que não. Vinte minutos depois, desisti e fui embora. Voltei à Ford disposto a fechar o negócio, afinal, foi onde consegui todas as informações que buscava. Encontrei o mesmo vendedor que me atendeu na primeira vez e falei da minha intenção de fechar o negócio. Conversa vai, conversa vem, nova surpresa! O preço do carro, agora, era R$ 4.000,00 mais caro que o dos concorrentes, e não R$ 2.000,00, conforme quatro dias atrás! Como assim? A resposta foi:
– Esse preço que o senhor tem é do modelo 2017.
Não, cara-pálida, inclusive você usou como argumento para justificar os R$ 2.000,00 a mais que seus concorrentes, justamente o ano 2018!
– Desculpe, mas acho que eu me enganei. Aguarde um momento que vou falar com o gerente. O vendedor voltou e, com a maior cara lavada, disse:
– Consegui reduzir em R$ 2.000,00 o preço, mas vou ter de pagar R$ 2.000,00 a menos no seu carro.
Fingi que não ouvi tal descalabro e disse-lhe:
– Esquece, fico com o modelo 2017 mesmo. Voltamos aos R$ 2.000,00 de diferença com seus concorrentes e encerramos o assunto.
– Ah! Infelizmente, não temos mais esse modelo.
Simples assim. Perdi uma semana tentando trocar/comprar o carro e não achei marca interessada em vender. Apenas respostas padrão, evasivas, propostas sem nexo, confusões e má vontade. Enquanto isso, as manchetes estampavam um vertiginoso declínio nas vendas dos automóveis zero-quilômetro. É a crise, dizem os representantes do setor! Digo eu, crise de despreparo dos vendedores, da falta de política nas trocas, do jeito antigo de fazer negócios e do desprezo das marcas por compradores. Gastam fortunas em campanhas publicitárias, mas não conseguem entender os anseios dos compradores. Perdem negócios às pencas. Será que não vão mudar nunca essa postura de vendas? Resolvi continuar com meu possante, ao menos, pelos próximos 10 anos!
Por Marcos Sá, consultor de mídia impressa, com especialização em jornais, na Universidade de Stanford, Califórnia, EUA. Atualmente é diretor de Novos Negócios do Grupo RAC de Campinas.