Paulista nascida em 1975, graduou-se em Psicologia pela PUC/SP. Por sete anos, trabalhou no Hospital do Rim e Hipertensão – UNFESP/EPM como psicóloga clínica e coordenadora de um projeto de artes, que idealizou a partir do trabalho da Dra. Nise da Silveira e da educadora Maria Amélia Pereira. O projeto Oficina de Artes levou-a para a School of The Art Institute of Chicago, onde tornou-se mestre em arteterapia. Nessa escola, descobriu o mundo das artes visuais, interessando-se, principalmente, pelos ateliês de pintura. Na ocasião, pôde frequentar o museu agregado à instituição e alguns ateliês da escola, descobrindo seu amor pela pintura e pela cor. Essas oportunidades significaram uma experiência única para o amadurecimento do seu olhar. Após esse período, inscreveu-se em um curso. O desenho a levou a uma nova percepção do mundo, que passou a ser para ela uma forma de expressar o que via e sentia.

Em 2014, deixou de trabalhar como psicóloga para dedicar-se exclusivamente ao trabalho no ateliê. Desde então, vem exibindo sua produção em mostras individuais e coletivas em espaços independentes, salões e instituições brasileiras e estrangeiras. Seu trabalho foi contemplado pelas fundações Instituto Sacatar, BA (2019), Ragdale Foundation, Chicago, EUA (2016 e 2019) e pelo instituto The Studios of Key West -TSKW, EUA (2015).

© André Conti

 

 

VAMOS OBSERVAR

Bananeira, 2021,

135 x 135 cm

linha de algodão em linho

 

E minha avó cantava e cosia. Cantava canções de mar e de arvoredo, em língua antiga. E eu sempre acreditei que havia música em seus dedos e palavras de amor em minhas roupas escritas. Os versos do poema Desenho, de Cecília Meireles, definem o que a artista sente quando vê alguém cosendo ou bordando. Por isso, em 2014, levou as linhas, tecidos e a caixa de costura da sua avó para o ateliê e, a partir de então, passou a explorar esse universo.

Cristiane, que é pintora, desenhista e bordadeira, trabalha a partir da observação da natureza e das coisas ao redor de seu ateliê, interessando-se pelos desdobramentos da linha, que substituem as tintas e pinceladas. Para ela, tudo é movimento e cor. Para mim, o trabalho de Cristiane Mohallem se assemelha ao dos impressionistas.

Ela é minha vizinha de ateliê, por isso tive a oportunidade de observá-la em ação muitas vezes. O bordado é uma arte que exige muito tempo, concentração e técnica.  A artista leva meses, às vezes até anos, para concluir uma obra. Ela borda de forma livre, a maioria das vezes em pé, sem moldes ou rascunhos, como se estivesse desenhando ou pincelando com a agulha.  As linhas se sobrepõem umas às outras, assim como acontece na pintura, com tintas de cores diferentes.  Vejo que Cristiane adaptou essa técnica ancestral para sua própria versão única, cheia de movimento, luz e detalhes. Somente quando se olha de perto é possível ver o tanto de camadas e linhas que cada obra abriga.

O bordado é um personagem tão antigo na história da humanidade quanto a nossa própria existência. Vestígios da técnica do que se conhece hoje, como ponto-de-cruz, foram encontrados ainda nos tempos da pintura rupestre, quando vivíamos em cavernas. Historicamente, a prática do bordado esteve inerente às mãos femininas e sequer era considerada uma expressão artística. Como tudo o que as mulheres faziam, era subestimado à margem da sociedade patriarcal.  Apesar de se tratar de uma prática que está presente na nossa sociedade há muitos anos, o bordado traz um novo significado e sentido a partir do momento que é usado na arte contemporânea. A renovação do bordado, que parte de uma geração em que tudo é rápido, descartável e feito em grandes produções, faz com que, logicamente, fosse colocado valor na precisão, qualidade e originalidade desta arte. O bordado na arte contemporânea brasileira é frequentemente usado como manifestação política e tem se intensificado dentro do movimento feminista.

Em 11 de setembro, a artista inaugurou sua exposição individual intitulada Árvore Adentro, no Museu do Objeto Brasileiro – A Casa, que fica em Alto de Pinheiros, São Paulo. Cristiane apresentará diversas obras feitas no período da pandemia, como um trabalho bordado com a imagem de um baobá de quase 4 metros de altura por 3 de largura e o trabalho Bananeira. Para mais informações, acesse www.acasa.org.br.


Por Milenna Saraiva, artista plástica e galerista, formada pelo Santa Monica College, em Los Angeles.

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