Dig Dutra: “temos que celebrar a vida das mulheres e seus direitos conquistados”

Atriz revela como superou assédio e depressão

Basta ligar a televisão para ver a atriz Dig Dutra, já que alguns dos principais trabalhos de sua carreira voltaram à telinha em reprises. Na Globo, ela está como Rochelle em A Força do Querer. Na Band, é a Bruxa Mega em Floribella. E no canal Viva, é a sua veia cômica que está no ar no humorístico Zorra Total como Abadia, aquela que roda tranças. Por conta de tantos trabalhos ao mesmo tempo e que apresentam nuances tão distintas, ela chegou a ser chamada de soberana das reprises, título que não a incomoda nenhum pouco. Pelo contrário, adora. Adora rever seus papéis. Para ela, é uma forma de reencontrar um lugar de conquista e, ao mesmo tempo, estímulo para buscar novos desafios. Na pandemia, com os trabalhos paralisados, resolveu investir nas artes plásticas, na escrita de peças, nos cursos on-line e nas ilustrações. Também adaptou o trabalho com o grupo de teatro para o universo on-line. Migrou para o Instagram e passou a fazer cenas de ficção ao vivo. Como ela mesmo afirma, a arte a salvou completamente durante este período tão crítico, porque a manteve ocupada e feliz. E ah, a felicidade… Dig é super alto-astral. Aos 45 anos, garante que o elixir de beleza e longevidade é a alegria. “Não pode é envelhecer por dentro”, garante. Mas quem a vê esbanjando sorrisos por aí, não imagina que ela já passou por um fase nebulosa, em que sofreu assédio psicológico e entrou em depressão profunda. Só conseguiu sair dessa com terapia, medicamentos e muito amor das pessoas ao redor. Hoje, encoraja outras mulheres a compartilhar suas histórias para que elas percebam que não estão sozinhas. Acha importante que a dramaturgia traga assuntos como esse à tona e sente-se orgulhosa de participar desse engajamento. Em entrevista à nossa equipe, já em uma fase em que diz que encontrou o equilíbrio ideal, ela abriu seu coração e seu livro de memórias. E aproveitou, é claro, para declarar amor à Granja Viana, bairro que frequenta bastante. Para ela, aqui é um daqueles lugares que a gente sempre quer voltar – e, sim, ela sempre volta!

Recentemente, você foi chamada de soberana das reprises. Isso porque, com a pandemia, as emissoras reprisaram algumas atrações e você esteve no ar em, nada mais, nada menos, que quatro produções. “Malhação”, “Força do Querer” e “Zorra Total”, na Globo, e também em “Floribella”, na Band. Como é se ver na TV, em tantos papéis diferentes, ao mesmo tempo? Você “se assiste”?
Assisto sempre que posso. Adoro rever. Mesmo que eu implique com alguma coisa, gosto muito mesmo de assistir e de me ver em cena. Sei o quanto trabalhei para cada papel e cada um deles me realizou de alguma forma. Ao assistir novamente reencontro esse lugar de conquista. Me estimula a buscar novos desafios. Tenho carinho por tudo que já fiz.

Qual a atuação inesquecível?
Tenho muito carinho por todos os meus personagens, mas meus preferidos são os que criei para meu espetáculo solo, que deve estrear em breve. São meus xodós.

Qual personagem foi mais difícil de compor?
Todo personagem é um desafio porque sempre quero ir além da minha zona de conforto. Nunca encaro algo como “esse é fácil”. Eu procuro, justamente, me superar, descobrir novas nuances. Esse é o meu trabalho. Me dedicar, estudar e crescer.

Tem algum papel que gostaria de representar e ainda não o fez?
Ainda quero fazer uma grande vilã. Adoro o processo de composição do personagem. Acho as vilãs muito ricas em termos de construção.

Uma de suas personagens marcantes foi Kátia, de “Malhação”. Mãe de uma adolescente e que tem que lidar com o drama de descobrir que seu marido está assediando a enteada. A personagem, em vez de sair em defesa da filha, a culpa pelo assédio. Como foi atuar em um papel como esse?
Não foi à toa que Malhação – Viva a Diferença foi premiada. É uma história maravilhosa, muito bem escrita é necessária nos dias de hoje. Os personagens geram identificação com o público e total empatia. O sucesso foi tão grande que deu origem a outra série chamada As Five, com o elenco principal de Malhação como protagonista. É urgente falar de diversidade e de inclusão.

Situações como “Malhação” apresentou parecem coisa de novela, mas não são. Isso acontece e muito na vida real, não?
Infelizmente, nossas cenas retratam a triste realidade de muitas meninas. O tema assédio é super-relevante e a forma como foi abordado foi muito significativo. Assédio é crime e é preciso denunciar. Acho maravilhoso como os autores usam a dramaturgia para informar e educar. Fico muito orgulhosa com esse engajamento.

Passou por alguma situação parecida?
Não.

Mas já foi vítima de outro tipo de assédio, o que resultou numa depressão profunda. Pode nos falar sobre isso?
Sofri assédio psicológico, que não deixa de ser danoso para quem sofre. Com o tempo, as sequelas são horríveis e a depressão é quase que inevitável. O mais assustador é que você não percebe de imediato. É algo que vai minando sua autoestima e vai te destruindo aos poucos até você se anular totalmente. E o pior é que não é lenda, você realmente se convence de que a culpa de tudo é sua. Só consegui sair dessa com terapia, medicamentos e muito amor de pessoas importantes para mim.

Você acha que compartilhar essas histórias é sempre importante para que as mulheres vejam que não estão sozinhas?
Acho muito importante falar e acho que a dramaturgia tem um grande papel ao tocar nesses assuntos. A exposição de tantos temas diversos e relevantes gera debate nas rodas de amigos, nas escolas, e até em casa. A identificação faz com que o espectador adolescente não se sinta sozinho com suas questões.

Entrando na seara das mulheres, agora em março comemora-se o Dia Internacional da Mulher. O que temos para celebrar?
A luta é grande, mas é notório que muita coisa já foi alcançada. Temos que celebrar a vida das mulheres e seus direitos conquistados.

Essa data simboliza a luta histórica das mulheres para terem suas condições equiparadas às dos homens. Inicialmente, essa data remetia à reivindicação por igualdade salarial, mas, hoje em dia, simboliza a luta das mulheres não apenas contra a desigualdade salarial, mas também contra o machismo e a violência. Você nos contou sobre o assédio que sofreu. E preconceito por ser do chamado “sexo frágil” já sofreu?
Sim, porque de forma errônea a mulher é desqualificada de imediato, simplesmente por ser mulher. É preciso provar o tempo todo que somos capazes e autossuficientes. Nem sempre é uma tarefa fácil. O machismo ainda reina no nosso país.

O termo “empoderamento feminino” tem sido bastante utilizado atualmente. Qual o significado dele para você?
A união das mulheres por meio da sonoridade, o encorajamento e estímulo para que a mulher se sinta e mostre o quanto é plena e capaz.

O que há de mais especial em ser mulher?
Surpreender.

Na sua trajetória até aqui, alcançou conquistas que antes nem faziam parte dos seus planos? Foi preciso se reinventar?
Sou muito determinada e o que conquistei foi muito próximo do que planejei. Adoro criar estratégias e corro muito atrás do que quero. Traço metas, estabeleço prazos e vou em frente! Sempre soube o que eu queria e batalhei muito para tudo acontecer.

Como se descobriu artista?
A arte nasceu comigo. Faz parte da minha vida desde pequena. Mas a atuação eu descobri quando, aos 14 anos, assisti a uma peça de teatro no colégio onde estudava e vi uma colega de turma em cena. Fiquei maravilhada ao vê-la interpretando um personagem tão diferente dela. Acho que foi aí que compreendi a beleza da profissão de ator. No ano seguinte, com 15 anos, fiz um teste e entrei no grupo de teatro. Ali tive a certeza de que eu queria ser atriz para sempre e não parei mais de estudar e batalhar por isso.

Conte-nos um pouco do início de sua carreira e os perrengues que enfrentou.
Sair do Paraná para batalhar a carreira no Rio de Janeiro foi um grande desafio. Comecei a fazer teatro, aos 15 anos, em Curitiba. Depois de formada em Artes Cênicas, pós-graduada em Cinema e com 11 anos de trabalhos realizados na minha cidade, resolvi colocar uma mochila nas costas e me mudar para o Rio de Janeiro, pois queria muito fazer televisão. Cheguei no Rio sem conhecer ninguém. Foi um trabalho de formiguinha porque, praticamente, tive que recomeçar do zero. Não posso dizer que foi fácil. Logo que cheguei no Rio, morei numa sacada. Não contava para meus pais as dificuldades que passava, porque tinha medo de que eles falassem para eu voltar e não queria desistir. Batalhei muito e nunca deixei de fazer teatro, que considero a base sólida para o meu trabalho. Recebi muito incentivo da minha família e dos meus amigos. Todos torcendo muito por mim e me incentivando. Isso foi muito importante e me deu muita força para seguir em frente, apesar dos desafios.

Em uma de suas entrevistas, você comentou que, desde o início da sua vida artística, colocava um tijolinho na sua história. Olhando hoje para trás, o que você construiu?
Construí uma carreira com base sólida, muito estudo e muito trabalho. Sou formada em Artes Cênicas e pós-graduada em Cinema e este ano completo 30 anos de carreira. Tenho muito orgulho da minha trajetória.

Você mesma declarou que a arte te salvou na pandemia.
Sim [sorri]. A arte me salvou completamente durante a pandemia. Me manteve ocupada e feliz, porque fico muito envolvida no processo criativo quando estou trabalhando. E a cada trabalho finalizado, sinto uma alegria tão grande, uma satisfação ao ver o produto final. Escrevi uma peça, pintei quadros e ilustrei um livro. Essa sensação de estar produzindo algo, fazendo a minha arte, foi muito importante para me manter bem durante o isolamento.

Durante a quarentena, você desenvolveu relações com as artes plásticas. Como encontrou esse espaço para se expressar? Você já havia se enveredado por este caminho?
Desenho bem desde criança e, naquela época, cheguei a fazer alguns anos de Oficina de Artes. Mas só agora resolvi investir no desenho e na pintura de forma profissional. 2019 foi um divisor de águas na minha vida, pois resolvi remexer nos meus talentos guardados. Desde a infância que não estudava mais desenho e resolvi resgatar isso. Lancei meu primeiro livro ilustrado. Fiz vários cursos, inclusive em Portugal. Participei de um vernissage e descobri que dava sim para conciliar as duas profissões. Durante a pandemia, me mantive na ativa, pintando vários quadros. Essa dobradinha de atriz e artista plástica tem me feito muito bem. Pretendo seguir investindo em ambas as carreiras. Dessa forma, me sinto completa.

Você também escreveu uma peça infantil, não é?
Escrevi uma peça linda sobre amizade e inclusão, que são temas que acredito e apoio. A amizade é uma das melhores coisas da vida e quando ela é isenta de preconceitos fica ainda mais bonita.

Falta alguma coisa na sua carreira? Ou já conquistou tudo que queria?
Falta muita coisa, porque no dia que não faltar nada é porque parei de sonhar. Sempre estou projetando novos desafios, nossas conquistas. Isso me mantém viva e empolgada. Ainda quero fazer muito teatro, muita televisão e cinema. Quero fazer exposições dos meus quadros e lançar novos livros.

Quais são suas inspirações?
Muitas coisas me inspiram. Minha família me inspira, meu namorado, meus amigos. Pessoas disciplinadas e trabalhadoras me inspiram. Gosto das histórias de superação e das conquistas improváveis. Uma frase que amo é: “Não sabendo que era impossível, ele foi lá e fez”, de Jean Cocteau.

Dig, você ficou conhecida como Maria da Abadia, no humorístico “Zorra Total”. É super astral, tem um sorriso lindo e já chegou a declarar que “uma boa risada tem poder de cura”. Gargalhar seria o elixir de beleza e longevidade?
Com toda certeza! Essa é a fórmula mais saudável da juventude. E os efeitos colaterais são incríveis! Eu recomendo! (risos)

E o seu segredo qual é?
Procuro levar a vida de maneira leve, com empatia pelo próximo e alegria de viver. Sou muito grata por tudo o que tenho, minha família, meus amigos. Tenho um propósito particular de me manter uma pessoa boa e levo isso a sério.

Não pode é envelhecer por dentro, esta é mais uma frase que você costuma dizer.
[reflete] Cada vez mais, as pessoas se preocupam com a aparência e isso gera o medo de envelhecer. Não tenho receio nenhum em relação à idade. Vou envelhecer por fora, não há dúvida. Mas por dentro, de jeito nenhum! Tenho uma menina muito viva e alegre dentro de mim. Para ela, o tempo não passa!

O que de mais importante a idade trouxe para você?
Com o passar dos anos, fui me tornando mais tranquila e mais segura. Tive que aprender a controlar a ansiedade e aprender que as coisas acontecem na hora certa. Confio em Deus, no plano que Ele tem para mim, faço minha parte da melhor maneira e não negligencio minha felicidade em detrimento do trabalho, por mais que ame muito o que faço. Acho que encontrei o equilíbrio ideal.

O quanto os padrões de beleza podem ser cruéis? Qual o caminho para fugir dessas imposições e nos valorizarmos como somos?
A imposição de determinados padrões pode causar danos emocionais muito sérios. É preciso estar atento para não se contaminar com essa busca utópica e nociva pela perfeição. Temos que nos amar mais.

Moda também é um assunto importante na sua vida. Quais são seus truques para arrasar?
Adoro moda, adoro acessórios e abuso das cores vivas. Gosto de peças exclusivas, com uma modelagem moderna. Não me considero muito casual. Gosto de roupas que imprimem personalidade.

Para finalizar, você é sempre vista pela Granja Viana. Como descobriu o bairro?
Conheci a Granja Viana com o meu namorado. Ele tem amigos no bairro e também gosta muito dos restaurantes. Já me levou para conhecer vários. Não tem como não gostar. O ambiente é muito agradável e tem uma energia boa. Daqueles lugares que a gente sempre quer voltar.

Por Juliana Martins Machado

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