Milenna Saraiva escreve sobre a arte de Johannes Vermeer

Nossa colunista escreve sobre um grande artista holandês e um dos expoentes do Barroco da “era de ouro da pintura holandesa”: "sua obra, denominada “pintura de gênero” foi dedicada às cenas da vida cotidiana. É caracterizada pelo uso magnífico de luz e sombra, observando-se certa influência italiana. A luz é usada com maestria para ressaltar a expressão, aprofundar ou criar uma atmosfera íntima e, ao mesmo tempo, dramática".

Filho de um comerciante de arte, seguiu a mesma carreira do pai e também se dedicou à pintura. Entre 1652 e 1654, estudou com Carel Fabritius, aluno número um do mais renomado pintor Holandês, Rembrandt. Produziu poucas telas, pois pintava bem devagar e, quase sempre, somente quando recebia encomendas. De suas 35 telas reconhecidas como autênticas só duas estão assinadas: A Alcoviteira (1656) e O Astrônomo (1668).

Vermeer (1632-1675) é considerado o segundo pintor mais importante do Barroco holandês, depois de Rembrandt. Ele retratava cenas da vida burguesa, repleta de simbolismo e intenções morais.

Em 1672, a Holanda foi invadida pelo exército francês e, embora a força de ocupação tenha sido rapidamente expulsa, a crise econômica que se seguiu provocou o colapso da economia e, consequentemente, do mercado de arte, agravando irremediavelmente a situação já instável do endividado pintor.

Vermeer faleceu em 15 de dezembro, aos 43 anos, deixando 8 filhos menores e uma esposa à beira da miséria, mas decidida a salvar suas obras. Catharina conseguiu esconder seus quadros dos credores.

Depois de sua morte, pairou sobre o nome de Vermeer um esquecimento imperdoável, que só seria desfeito pela crítica dois séculos depois, quando um perito francês chamado Théophile Thoré atribuiu-lhe 76 telas – embora o número reconhecidamente autêntico oscile hoje entre 35 e 21. Não há, portanto, unanimidade em relação a todos os trabalhos que integram as maiores galerias do mundo.

VAMOS OBSERVAR

Moça com Brinco de Pérola
1665
Óleo sobre tela
44 cm x 39 cm
Museu Mauritshuis, Haia 

A pintura Moça com Brinco de Pérola, datada do século 17, está exposta no Museu Mauritshuis, em Haia, onde é vista por cerca de 200 mil pessoas que visitam o local todos os anos. Conhecida como a “Mona Lisa do Norte”, esta pintura representa o melhor da arte holandesa. Também envolta em mistério (muito parecido com a obra de Leonardo da Vinci), ela se tornou uma das pinturas mais amadas da história da arte.

Além da identidade da garota ser desconhecida, muitos outros mistérios rondam a obra. Em nota à imprensa, pesquisadores do museu recentemente revelaram alguns deles, após realizarem uma análise aprofundada sobre a tela. Eles descobriram, por exemplo, traços de cílios delicados e sobrancelhas, imperceptíveis a olho nu, pois provavelmente foram apagados por algum tipo de restauro ou limpeza inadequada. Usando técnicas de raio-x, encontraram evidências de uma cortina verde posicionada atrás da garota, que hoje também não está visível. Com o estudo, eles também puderam entender como Vermeer pintou a obra, quais mudanças ele fez e quais pigmentos ele usou. Quem imaginaria que o branco usado para pintar o brinco da moça tivesse vindo da Inglaterra? Um dos pontos mais interessantes da obra é o lenço azul na cabeça da moça. Para pintar o elemento, o artista usou uma tinta na cor azul ultramarino de altíssima qualidade, feita a partir da pedra semi-preciosa lápis-lazúli, que teria vindo do atual território do Afeganistão. Para se ter uma ideia, na época em que a obra foi pintada, essa tinta valia mais que ouro! Uma descoberta recente do projeto foi que a lápis-lazúli pode ter sido aquecida a altas temperaturas, o que teria ajudado a criar um tom de azul mais intenso.

A Moça com Brinco de Pérola de fato não foi pintada para ser um retrato fiel, já que a garota não apresenta muitas características distintas. Na verdade, Vermeer executou a obra como uma espécie de estudo de uma mulher idealizada. No entanto, mesmo que a pintura não tenha características muito específicas, a presença dos cílios, revelada pelos mais recentes estudos, sugere que a moça em questão foi pintada de maneira mais pessoal e menos idealizada do que se pensava anteriormente. Segundo o Museu, é possível que uma garota de verdade tenha servido como modelo para a pintura. Sua identidade, porém, continua um mistério.  Alguns dizem que ela poderia ser uma das filhas do pintor. Outros dizem que, por sua expressão e olhar, a moça poderia ser funcionária da casa e amante do artista. Neste caso, ele a teria vestido com roupas (e o brinco de pérola) especialmente para pintá-la.

A obra continua sendo uma das pinturas mais famosas do mundo.  Além de seu contexto fascinante e estética atraente, ela é realçada pelo mistério que a cerca.  A garota com brinco de pérola está bem ali, não há nada entre ela e nós. Ela tem essa qualidade mágica de ser incrivelmente aberta e misteriosa ao mesmo tempo – e é isso que a torna tão atraente.


Por Milenna Saraiva, artista plástica e galerista, formada pelo Santa Monica College, em Los Angeles.

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