Beksiński produzia suas pinturas e desenhos em um estilo que chamava ora de barroco, ora de gótico. O primeiro estilo era dominado pela representação, com os exemplos mais conhecidos de seu período de “realismo fantástico”, em que ele pintava imagens perturbadoras de ambientes surrealísticos e atemorizantes. O segundo estilo é mais abstrato, sendo dominado pela forma e tipificado pelas últimas pinturas do artista. Podemos classificar seu trabalho como realismo fantástico ou surrealismo distópico. Uma mistura de Dali e H.R. Giger.

Estudou arquitetura, ou seja, não tinha nenhuma formação em pintura. Interessou-se por fotografia, fotomontagem e escultura. Na fotografia, trabalhou com vários temas que também apareceriam em suas futuras obras.

O artista preferia o isolamento de seu estúdio, sempre em companhia de música clássica. Não comparecia sequer aos seus vernissages. Sobreviveu à Segunda Guerra Mundial e sua arte refletia também os horrores das batalhas. Nos anos 1990, criou uma série de pinturas surreais que exploravam sempre as mesmas temáticas: a morte, a solidão, pesadelos e o apocalipse. As pinturas desta série foram menos detalhadas do que seu “período fantástico”, porém não menos poderosas.

Em sua vida, presenciou várias tragédias que contribuíram para sua melancolia e depressão. Depois da guerra, sua esposa Zofia morreu de câncer. Um ano depois, no Natal, seu filho Tomasz cometeu suicídio. Em 21 de fevereiro de 2005, o artista foi encontrado morto em seu apartamento em Varsóvia, com 17 facadas. Robert Kupiec, filho adolescente do cuidador do artista, foi preso e declarou-se culpado. Kupiec foi condenado a 25 anos de prisão. Especulam que o artista foi assassinado porque não quis emprestar dinheiro ao jovem.

 

VAMOS OBSERVAR
Untitled 72,5 x 87 cm
1975
Tinta óleo sobre painel de madeira

 

Beksiński não colocava títulos em suas obras. Artistas que fazem isso, geralmente não querem revelar significados profundos e pessoais sobre suas criações. A falta de uma guia de compreensão, o título, abre o caminho para que o espectador tire suas próprias conclusões sobre o que vê. Assim, além do artista nos dar toda a liberdade para fazermos nossas divagações poéticas, sabemos que as imagens não são um simples recorte do mundo, e sim uma impressão, um rastro, um traço visual do tempo que quis tocar.

O artista disse que queria pintar como se estivesse fotografando seus sonhos. Pintar sonhos! Quem conhece um pouco dos trabalhos de Beksiński diria que ele desejava mesmo era “fotografar” pesadelos, daqueles bem sombrios. No entanto, Beksiński sempre afirmou que não sabia o que suas pinturas significavam, porém apreciava suas formas. Seguindo essa vertente, podemos dizer que a obra é como um sonho. Tudo o que pode ser imaginado, pode ser sonhado, mas mesmo o mais inesperado dos sonhos é um quebra-cabeça que esconde um desejo, ou então o seu oposto, um medo.

O pintor é conhecido por alguns como “o artista do Apocalipse” e por outros como o fundador das “Artes Negras”. Ele ganhou tais apelidos pelo aspecto grotesco e sombrio das figuras cadavéricas ou em decomposição que representava, pela metamorfose que o corpo humano adquiria e pelas ruínas de lugares fantásticos e devastados.

Para mim, Beksiński é o pintor do pós-apocalipse. Em suas obras, vemos um mundo devastado e seus sobreviventes. As paisagens de Beksiński em geral são sombrias, parecem estar abandonadas, às vezes habitadas por seres com corpos esqueléticos e deformados. A neblina, a ruína, a sensação de solidão, de esquecimento, desolação, assim como a grandiosidade dos elementos arquitetônicos fantásticos, perto da pequenez dos seres humanos, os quais já perderam suas características e não passam de fantasmas, são elementos reiterados constantemente nas imagens apresentadas pelo artista. A obra pode ser vista como o retrato de uma cidade-purgatório, onde as pessoas, no caso os esqueletos, ficam em volta de uma fogueira, cada grupo em sua torre de pedra, distantes uns dos outros. Vemos que algumas fogueiras já foram extintas, pois ainda conseguimos observar as cinzas restantes e a ausência de seres ao redor delas. As torres de pedra se repetem até as perdermos de vista. A pintura, com seus tons escuros e quentes, nos transmite uma sensação de espera contínua, assim como de inviabilidade de deslocamento. Pela lógica do purgatório, após cumprirem suas penas, as pessoas sairão dele um dia, contudo a impressão que essa imagem passa é que jamais o farão.

As obras de Beksiński falam sobre a condição humana após situações catastróficas, mas assustadoramente atuais. Qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência?


Por Milenna Saraiva, artista plástica e galerista, formada pelo Santa Monica College, em Los Angeles.0

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