Estudante de 16 anos é uma entre tantas vozes contra o racismo na Granja Viana

Neste mês de celebração do Dia da Consciência Negra, destacamos a notável jornada de Matteo Perino Gianfrancesco, estudante do Colégio Rio Branco, como ativista na luta contra o racismo e promoção da igualdade racial.

Novembro traz a celebração do Dia da Consciência Negra, uma data simbólica para resgatar a cultura, a memória e a dignidade dos povos escravizados. Neste contexto, surge a necessidade de destacar e reconhecer as lideranças negras que, mesmo em ambientes majoritariamente brancos, se empenham na luta contra o racismo e em exaltar as origens e fortalecer o senso de pertencimento.

Matteo Perino Gianfrancesco estudante do primeiro ano do Ensino Médio do Colégio Rio Branco, é um exemplo inspirador desta luta. Filho de um advogado e uma designer de interiores, apaixonado por esportes e com aspirações na área da saúde, este jovem de 16 anos tornou-se ativista da causa em 2022, quando um colega foi vítima de discriminação racial. “Eu o acolhi. Nos tornamos melhores amigos e começamos uma liderança no Colégio Rio Branco”, lembra.

O caminho não tem sido fácil, mas Matteo está determinado a combater o racismo não apenas para sua geração, mas sobretudo para as futuras. “Sendo um líder da comunidade negra, antirracista, em um colégio majoritariamente branco, tenho a missão de promover um olhar inclusivo e incentivar o conhecimento sobre essa luta. É sobre representar meu povo, que vive no anonimato deixado sem reparo”, defende. “A representatividade negra na minha escola é muito importante não para a maioria, mas sim, para uma minoria, jovens negros, que precisam ser representados”, completa.

O jovem cita o apoio de figuras como a professora de Biologia, Maryana Gonçalves Eiras, que traz essa representatividade para dentro da sala de aula. “Ela usa exemplos de pessoas negras, com corpos pretos, em diversas áreas da Biologia, e isso me deixou fascinado, foi a primeira vez que vi isso”, revela.

Conscientização e diálogo são as palavras de ordem. Para combater o racismo na escola, Matteo não apenas busca informações, mas também cria textos e folhetos explicativos, além de salas temáticas. Em uma delas, inclusive, em parceria com o amigo Pietro da Cunha Cadete, abordou o declínio e a ascensão do povo negro ao longo da história.

Agora, ele está trabalhando em projetos para fortalecer o diálogo sobre a questão racial, incluindo uma roda de conversas para compreender melhor a realidade dos estudantes em relação a esse tema. “Tenho conversado bastante com amigos, colegas e, principalmente, professores, como o de História, Caio Mendes dos Santos (foto). Estamos pensando, principalmente, sobre com quem devemos atuar primeiro para tornar o colégio um ambiente mais agradável e inclusivo”, compartilha.

Para os jovens que desejam se tornar líderes na luta contra o racismo, oferece palavras de incentivo: “não tenham medo, se arrisquem o quanto puderem, pois nunca saberemos se algo realmente deu certo, se nunca tentarmos. Diria, principalmente, que não estamos sozinhos. Crie forças. Duas pessoas falando é algo mais poderoso que uma sozinha e, assim, sucessivamente”.

Matteo deixa uma mensagem contundente para aqueles que não vivenciam o racismo diariamente: “O Brasil ainda é um país racista, e se você não enxerga isso, basta querer sair da sua bolha. Isso que nós vivemos é realidade. Um jovem negro morre a cada 23 minutos no Brasil! Então, fiquem ligados, pois nós lutamos, estudamos e nos empenhamos para saber tudo sobre o racismo (o que é racismo estrutural, negritude, colorismo, etc.), enquanto muitos de vocês não dão a mínima. Racismo não é um problema nosso, mas, sim, do opressor. O problema acaba virando nosso, porque muitos estão tão confortáveis na branquitude que esquecem de que somos gente também. Respiramos, comemos, bebemos, dormimos, temos desejos, sentimos dor, medo e sagramos igual a você. Mas não significa que somos iguais, porque não somos. Nem por isso merecemos ser desrespeitados. Uma dica: caso queira saber mais sobre isso, evite pedir para uma pessoa preta ensinar. O primeiro passo tem que partir de você mesmo, busque se informar”.

Em um apelo final, Matteo encoraja os jovens negros a não terem medo de lutar pelos seus direitos e lembra que a luta contra o racismo é uma responsabilidade compartilhada. Sua trajetória mostra que o diálogo e a conscientização são fundamentais para construir um ambiente mais justo e inclusivo.

Outras lideranças na promoção da igualdade racial

O professor Caio Mendes dos Santos, citado por Matteo, é uma das figuras centrais nos esforços para promover a igualdade racial e a representatividade na comunidade escolar. Além dele, outros estão empenhados em abordar questões de diversidade, inclusão e liderança negra.

“Temos algumas pessoas negras que me inspiram, tanto pelo que realizam no ambiente escolar quanto pelas suas trajetórias pessoais. Poderia citar Marisa Santos, líder no projeto Monitoria CRB, que atua diretamente com os jovens na reflexão sobre empatia e respeito. Tânia da Silva, Aldê Santos e Josué Santos são inspetores conhecidos pela maneira como acolhem todos, cada um com seu jeito. Samara dos Reis e Maryana Eiras são duas professoras, colegas de trabalho muito inteligentes e inspiradoras”, enumera.

Ele destaca o papel dos adultos, em especial dos professores, como exemplos influentes para os estudantes. A sensação de pertencimento, segundo ele, vem do reconhecimento e identificação com essas figuras inspiradoras: “acredito que essas pessoas servem de modelo em diversas situações, não apenas como profissionais. A sensação de pertencimento vem de um reconhecimento, de olhar para o outro e se enxergar, se identificar”.

Caio é professor de História (Ensino Fundamental) e Pesquisa e Mundo Contemporâneo (novos componentes do Ensino Médio), além de Coordenador de Projetos e fundador do Coletivo Humana Mente. Enfatiza seu papel como líder na sala de aula, particularmente ao lecionar História, uma disciplina propícia para reflexões sobre a cultura afro-brasileira. “Acredito que meu papel seja de ajudar os estudantes a compreender melhor o mundo em que vivem, as reflexões do tempo presente, e as questões de identidade, representatividade e combate ao racismo estão sendo amplamente debatidas. No Coletivo Humana Mente, que é uma atividade opcional e complementar ao currículo, tenho um espaço ainda mais interessante, na medida em que temos um local de debate autêntico, genuíno, com tempo para podermos nos aprofundar”, comenta.

Embora aponte os desafios enfrentados pelas lideranças negras, que vão de situações de racismo estrutural à necessidade de combater estereótipos, Caio observa uma mudança positiva, com a sociedade revendo comportamentos e a escola desempenhando um papel crucial nesse processo. Ele destaca que o colégio adota a frase “respeito é inegociável” como uma diretriz constante. “Isso significa que todos estamos constantemente atentos ao combate à intolerância, ao bullying e a outras situações de conflito. A escola precisa ser um ambiente seguro para todo mundo”, explica. “Somos referência na inclusão de estudantes surdos, que contam com ensino de Libras e intérpretes em salas de aula regular, por exemplo. E há um trabalho específico da Orientação Educacional para acolher os estudantes com necessidades educativas especiais, demandas emocionais e outras situações. A parceria com o Ismart e o lançamento da Bolsa Rio Branco permitiu que mais estudantes negros pudessem estudar no Colégio”, completa.

Além disso, iniciativas recentes buscam desenvolver lideranças conscientes e engajadas. “Uma delas é a Monitoria, que promove com estudantes de 9º ano do Ensino Fundamental e Ensino Médio ações com o objetivo de trabalhar conceitos como liderança e ética. Os monitores estão estudando cada vez mais, em uma espécie de letramento racial, para que as atividades que realizam sejam representativas e não reproduzam estereótipos racistas. Outra iniciativa, coordenada por mim, é o Coletivo Humana Mente, que reúne professores, estudantes e intérpretes de Libras. O projeto, que já existe há mais de 10 anos, se estrutura a partir de um mergulho profundo em um tema, com muitos debates e troca de referências. Já discutimos  intolerância racial, colorismo, afrofuturismo, racismo ambiental, racismo algorítmico, entre outros. Em 2023, o tema escolhido foi ‘corpo’ e, portanto, as questões relacionadas à cor de pele, branquitude e racismo têm aparecido intensamente. Há poucas semanas fomos visitar a exposição Dos Brasis – Arte e Pensamento Negro, atualmente em cartaz no Sesc Belenzinho, que reúne 240 artistas negros de todo o Brasil. Foi um momento muito importante para aprofundarmos nossas discussões e buscarmos inspiração para produzir arte que leve essa reflexão à nossa comunidade”, explica.

Para ele, além da representatividade, o principal ponto é não deixar que assuntos tão importantes, como o combate ao racismo, saiam da pauta do dia. “Estamos em um momento de reflexão interna com nossa comunidade – estudantes e suas famílias, equipe gestora, professores e demais colaboradores. No entanto, posso dizer que as produções escolares, como trabalhos, revistas, vídeos etc, principalmente as produções artísticas, pretendem contribuir para a igualdade racial com informação e sensibilização”, menciona.

E finaliza, destacando a escola como um espaço privilegiado para reflexão, conscientização e ação. “A partir da máxima ‘ninguém nasce racista’, conseguimos perceber que o racismo acaba sendo ‘ensinado’ socialmente. Portanto, se somos capazes de aprender, que aprendamos a agir de maneira respeitosa, pacífica e empática”, conclui.

Por Juliana Martins Machado

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