Natural do Peru, país conhecido gastronomicamente pelo ceviche e outros pratos de pescados, o chef e açougueiro Renzo Garibaldi ganhou fama internacional pelo tratamento especial dado às carnes em seu Osso Carnicería & Salumeria, açougue e restaurante instalado na capital Lima. Hoje na 25ª posição do Latin America’s 50 Best Restaurants, Renzo iniciou sua trajetória no mundo das carnes em 2010, quando em uma viagem a São Francisco, nos Estados Unidos, descobriu o mundo da carniceria sustentável. Foi amor à primeira vista, ou melhor, ao primeiro corte, quando o chef participou de uma aula com o maestro carniceiro Ryan Farr. Desde então, Renzo não tirou mais a faca da mão e seguiu aperfeiçoando a nova paixão até transformá-la em habilidade. Sua especialidade é a maturação pelo processo chamado de dry-aged, ou seja, a seco e em temperatura controlada, o que garante uma carne mais macia e suculenta. A convite do empresário Alexandre Mora, de quem já é parceiro nos restaurantes paulistanos Cór e Ânima Mea, o chef peruano desembarcou na Granja Viana (lugar que adora, diga-se de passagem!) para assumir a churrasqueira do recém-inaugurado Carne. Aproveitamos sua estadia por aqui para conversar sobre a arte do churrasco, saber como reconhecer uma boa peça e pedir dicas para preparar um bom assado. De sorriso largo, proporcional aos seus mais de 1,90 m de altura, e com seu inseparável boné, Renzo é uma figura adoravelmente carismática. Diz que o Brasil é um ótimo país para amantes de carne e, por acreditar na nossa criatividade, afirma que temos todos os elementos necessários para reinventar o churrasco e fazer algo totalmente novo e genuíno. Defende o uso das mãos no lugar dos talheres, por acreditar que, assim, nos conectamos mais com a comida. E faz questão de ressaltar que uma boa carne não precisa de muito mais do que sal, fogo e tempo.
 
Renzo por Renzo. Quem é você? Como descreveria a si mesmo?
Eu sou Renzo Garibaldi, açougueiro e chef dos restaurantes Osso e Dondoh, em Lima, no Peru, além de consultor do Cór, do Ânima Mea e, agora, do Carne, na Granja Viana.  Nasci no Peru e sou apaixonado por carnes desde que minha memória pode lembrar. Desde sempre busco entender as carnes, principalmente em sua interação com o fogo. Portanto, me descreveria como um açougueiro amante do fogo. (Risos.)
Como o churrasco entrou em sua vida?
As primeiras memórias que tenho de churrascos são nas casas de amigos, observando como os pais deles manuseavam a grelha. Sempre procurava ficar em volta, tentando ajudar e aprender. Não demorou muito para que começassem a me convidar para assumir a churrasqueira, e, assim, descobri que amava fazer aquilo.
Quem são as pessoas que te inspiraram e ainda te inspiram?
Várias pessoas me inspiraram muito em diferentes aspectos da vida. Meu pai sempre foi uma grande inspiração, apoio e incentivo. Chefs peruanos como Gastón Acurio, do Astrid & Gastón, por exemplo, também são uma influência importante para mim, por terem criado restaurantes reconhecidos como embaixadas gastronômicas do Peru em todo o mundo. Dario Cecchini, da Antica Macelleria Cecchini, e Joshua Applestone, da Applestone Meat Company, são provavelmente minhas maiores referências como açougueiro, pois deram um novo sentido ao ofício, não só o tornando mais cool e sexy como, também, o mais sustentável possível.
Como a produção e o comércio de carnes pode ser feito de maneira mais sustentável? Que ações você adota para que garantir a sustentabilidade do processo?
Mantemos um relacionamento com os nossos fornecedores, nos informamos sobre o que eles fazem e como o fazem, nos envolvemos diretamente neste processo. Também nos preocupamos em usar o animal inteiro, todas as suas partes, respeitando o que cada corte pode oferecer de melhor em vez de apenas transformar tudo em carne moída. Dessa forma, garantimos que precisaremos abater menos animais para satisfazer as necessidades do mercado por carne.
Como funciona o processo de maturação da carne que você adota?
Utilizo o processo de maturação a seco, conhecido como dry-aged, que mantém umidade, temperatura e movimento do ar sob controle para criar um ambiente no qual a carne perca água e ative enzimas. O processo realça os sabores naturais e amacia a carne.
Qual técnica de preparo de carnes mais te agrada?
Eu gosto do fogo. Na verdade, amo o fogo! E onde há fumaça, há fogo. (Risos.) Atualmente, estou especialmente apaixonado pela fumaça.
Tem preferência por algum tipo específico de corte ou animal? Qual e por quê?
Cortes e carnes de diferentes animais dependem sempre de como serão preparados e consumidos. Gosto de carne bovina e suína acima de tudo, e de trabalhar com todas as partes do animal, aproveitando-o ao máximo. Cada parte mínima, cada corte, tem uma maneira mais adequada de preparo para que seu sabor seja realçado e possa nos oferecer uma experiência culinária única e incrível.
É possível fazer uma excelente carne com cortes menos nobres ou de segunda? Como transformar uma carne de segunda em carne de primeira?
Não é possível transformar carne de segunda em carne de primeira, mas isso não quer dizer que não existam maneiras de extrair o melhor daquele corte. Você pode, por exemplo, salgar e defumar um brisket até que fique macio e suculento, mas jamais conseguirá fazer com que um corte “magro” vire um corte “gordo”.
Como escolher uma boa peça de carne? Quais características devem ser observadas?
A melhor forma de escolher carne é conversando com o seu açougueiro. Pense: se você tiver uma dor de dente, irá procurar um dentista, certo? Então, se você quer comprar carne, procure um especialista também. Vá a um açougue, desenvolva uma relação de confiança com o açougueiro e, com certeza, ele cuidará bem de você.
Qual o segredo para preparar bem a carne?
Escolha um bom corte de carne, selecione o método certo de cozimento, tenha paciência, dê tempo à carne para que chegue ao ponto que você quer e não a cozinhe demais. Uma boa carne não precisa de muito mais do que sal, fogo e tempo.
Como saber que uma carne está no ponto ideal?
Esta é uma pergunta difícil! (Risos.) Com a experiência, você desenvolve diferentes técnicas, mas a mais fácil delas talvez seja enfiar a ponta da faca na carne por alguns segundos para medir a temperatura interna: para uma carne ao ponto, é preciso que a faca esteja morna, enquanto para uma carne malpassada, a temperatura deve estar mais para fria.
Em uma de suas entrevistas, você ensina: não ponha carne gelada no braseiro. Por quê?Carne é um músculo composto por fibras. Se estiver fria quando é colocada no fogo, se contrai. Portanto, precisamos que esteja o mais morna possível para que o resultado final seja uma carne mais macia e suculenta.
Poderia nos dar outras dicas para um churrasco excelente? Quais são as melhores técnicas de preparo do churrasco?
Todas as técnicas são ótimas e é divertido dominar todas elas. Meu conselho é escolher uma para dominar e, só, então, passar para a seguinte. Comece grelhando a carne, avance para a churrasqueira e, por fim, aprenda a defumação, processo que exige mais conhecimento, atenção e experiência.
Qual a diferença no sabor de uma carne preparada no braseiro a lenha para uma preparada no carvão?
O carvão produz muito calor e alguma fumaça, proporcionando um sabor muito peculiar. Já a lenha empresta mais sabor à carne, mas produz um calor mais difícil de ser controlado. O ideal é começar com um braseiro de carvão e, aos poucos, ir misturando com lenha.
Tem algum hábito brasileiro relativo a churrasco que chama a sua atenção pelo lado positivo ou negativo?
O Brasil é um ótimo país para amantes de carne. Os brasileiros não só consomem muita carne como também têm acesso a um produto de excelente qualidade e a várias técnicas de preparo. Uma das minhas favoritas daqui, por exemplo, são os espetos.
Qual seria uma heresia na churrascada ou no preparo de carnes em geral?
Lutar contra a carne é um problema, assim como tentar usar molhos ou técnicas de preparo que se sobrepõem ao sabor da carne.
Das suas andanças pelo mundo, qual país você acredita que tenha a melhor carne hoje?
Provavelmente a melhor carne que comi recentemente foi na Espanha. As vacas e os bois envelhecidos que o país consome são incríveis, com muita gordura e tecido conjuntivo. É uma verdadeira arte o que eles fazem para envelhecê-los e cozinhá-los ao ponto perfeito. É minha carne preferida atualmente.
Como você vê esse crescimento do churrasco no Brasil?
Percebo que o churrasco é uma tendência no Brasil hoje. Acho interessante observar o que será feito depois que todas as técnicas básicas forem dominadas e, então, se comece a inovar. Os brasileiros são muito criativos e têm a carne, a madeira e os conhecimentos de serralheria necessários para reinventar o churrasco e fazer algo totalmente novo e genuíno em seu país.
Você está desembarcando por aqui para assumir a grelha do Carne. Não é a sua primeira incursão em um restaurante brasileiro, certo? Como começou sua relação com o Brasil? E com a nossa região?
A primeira vez que cozinhei no Brasil foi há alguns anos, a convite da minha grande amiga Alexandra Forbes. Naquela ocasião, tive a oportunidade de conhecer muitas pessoas bacanas e, assim, fui convidado a retornar algumas vezes para cozinhar em eventos privados e conhecer mais sobre a cultura brasileira. Foi assim que conheci Alexandre Mora, com quem decidi fazer algo mais consistente no Brasil. Começamos com o Cór, depois veio o Ânima Mea, e, agora, o Carne, nosso novo projeto. E um dos mais divertidos, que espero que vocês gostem e aproveitem. Também conheci a Granja Viana a convite do Alexandre, frequentando o antigo Cabaña del Asado.
O que a população da Granja Viana pode esperar desta parceria com o Carne?
Podem esperar carne, muita carne, da melhor qualidade, tanto para comer no restaurante quanto em casa. Isso é o mais legal: as pessoas vão poder levar nossos produtos para casa, compartilhar com a família e amigos. Um dos nossos principais objetivos é dar aos nossos clientes a oportunidade de serem mestres do churrasco dentro da própria casa, com uma ajudinha nossa. Teremos, por exemplo, alguns tipos de briskets, o rei das carnes defumadas, além de outros cortes surpreendentes. Mas vocês precisarão vir prová-los com a gente, não quero estragar a surpresa.
O que você diria que é o diferencial? O que faz do menu e da carne únicos?
Toda carne é única, seja para o bem ou para o mal. Eu diria que o que faz da nossa especial são as técnicas de maturação a seco, o cuidado que colocamos no preparo e o conhecimento que acumulamos ao longo de oito anos viajando pelo mundo, pesquisando e trabalhando com carnes.
Quais pratos você considera imperdíveis para os granjeiros saborearem?
Meu prato preferido é o brisket, mas não deixe de experimentas as BBQ Ribs (costelas), os hambúrgueres e tudo o mais que encher seus olhos ao ler o menu.
Você já conhecia a Granja Viana, né? Quais são suas impressões do bairro?
Eu adoro o bairro! É um lugar com clima muito familiar, em minha opinião, algo que gosto muito. Sinto que escolhemos um bom lar para nosso novo projeto e esperamos ser realmente parte da vizinhança muito em breve.
 

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