Recentemente, tive a honra de receber o renomado enólogo argentino Laureano Gomez em um jantar harmonizado no restaurante Chez Maria, na Granja Viana.
Laureano, que esteve em tour pelo Brasil para promover sua produção própria de vinhos, concedeu uma entrevista exclusiva à Revista Circuito, sendo essa a única mídia da região a conversar diretamente com o enólogo.
Laureano nasceu e foi criado na famosa região vinícola de Mendoza, na Argentina. Após concluir seus estudos em enologia, ele rapidamente se destacou no cenário vinícola internacional com passagens por grandes vinícolas, como Catena Zapata, Luigi Bosca e Salentein – e, nesta última, seus vinhos receberam diversas medalhas.
Sua carreira o levou à posição de Chefe de Enologia na Trapiche, uma das maiores vinícolas do mundo, onde solidificou sua reputação e ganhou prêmios em competições internacionais. Entre suas conquistas mais notáveis estão o Best Malbec, no Argentina Wine Awards e a Medalha de Ouro no Concours Mondial de Bruxelles. Seus vinhos são reconhecidos pela Wine Spectator e pela Decanter, entre outras publicações especializadas.
Durante sua passagem pela Granja Viana, Laureano compartilhou seus conhecimentos e experiências, oferecendo insights valiosos sobre as tendências da indústria do vinho, os desafios do aquecimento global, o impacto do terroir e sua perspectiva sobre vinhos naturais e orgânicos.
GOSTA DE VISITAR O BRASIL?
(risos) Adoro! O Brasil é um país maravilhoso, e o povo brasileiro é caloroso, apaixonado e sempre pronto para uma boa conversa. Eu também sou fã da gastronomia brasileira – a variedade e a riqueza dos sabores são incríveis! Mas preciso ser honesto, embora a comida brasileira seja fantástica, ainda acho que a carne argentina é insuperável. Espero que vocês me perdoem por essa brincadeira! (risos)
SOBRE O TERROIR, O CONCEITO É FUNDAMENTAL NA ELABORAÇÃO DO VINHO. EM SUA OPINIÃO, QUAIS CARACTERÍSTICAS DE UM TERROIR SÃO MAIS SUBESTIMADAS E COMO IMPACTAM NO ESTILO DO VINHO?
Está bastante claro que o solo e o clima têm um papel crucial na qualidade da uva. Porém, o impacto genético da planta e a interação com o solo e o clima nem sempre são tão evidentes. Mesmo com um excelente solo e clima favorável, se não houver uma escolha adequada do clone da videira, nunca será possível obter uma uva de qualidade.
ESTAMOS VENDO MUDANÇAS NAS PREFERÊNCIAS, COMO O AUMENTO DA POPULARIDADE DOS VINHOS NATURAIS E ORGÂNICOS. COMO VOCÊ VÊ ESSA TENDÊNCIA E QUAIS SÃO OS DESAFIOS E OPORTUNIDADES QUE ELA APRESENTA PARA A INDÚSTRIA?
Há um equívoco ao pensar que existe vinho tradicional e outro natural. Nós fazemos vinho praticamente com 100% de uva, perfeitamente natural, adicionando apenas 0,01% de sulfito, que desaparece durante a fermentação. O valor final está no mesmo nível que o de um ‘orgânico’. O vinho orgânico implica no não uso de agroquímicos na produção da uva. Existe muito marketing envolvido, e alguns produtos sob o rótulo ‘orgânico’ escondem defeitos que não deveriam estar presentes.
COMO O AQUECIMENTO GLOBAL ESTÁ IMPACTANDO O VALE DE UCO?
Sem dúvida, regiões com maior amplitude térmica, sempre abaixo de 30°C de máxima, serão terroirs com mais potencial. Os novos locais em altitudes mais elevadas permitem esse objetivo. Hoje, já há ensaios com novas variedades que suportam mais calor ou que mantêm uma acidez mais alta, mas ainda precisamos confirmar a qualidade enológica dessas uvas. O Vale de Uco é uma solução ao aquecimento global. Há 25 anos, não podíamos ultrapassar os 1150 metros para a produção de uvas destinadas a vinhos encorpados, concentrados e de guarda. Hoje, já temos produções comerciais a 1500 metros que mostram essas características.
PAULA PORCI
Consultora, palestrante e colunista de bebidas
Juíza de vinhos Sommelière de vinhos ABS-SP e AIS-FR
Fundadora da Confraria das Granjeiras