Tenho um cunhado que lutou na guerra do Vietnã.

É uma pessoa traumatizada pela guerra.

Era um jovem “mariner”, proveniente do meio oeste dos Estados Unidos que despencou naquele inferno como franco atirador. Diz que ficava por dias sozinho no meio da selva dentro de uma trincheira observando a mata e matando vietcongues que eventualmente se aproximassem.

Conta também, de travessias pelos rios onde os amigos da frente e os de trás caíram mortos e ele escapou…

Eu nem gostava muito de ouvir estas histórias pois morria de pena ao pensar naqueles jovens lutando uma guerra que nem era deles.

Ao entardecer dos fins de semana que passávamos juntos, no sítio da família, era comum que ficasse extremamente angustiado ao olhar a mata atlântica que rodeava o sítio, que lhe lembrava os terríveis momentos da guerra.

Bastante influenciada por estes relatos, e, filmes e mais filmes que já assisti sobre o tema, tinha uma preconcepção já formada.

Achei que iria encontrar um povo machucado, magoado, e declaradamente antiamericano.

Preconcepção já é por si só um conceito horroroso, que blinda para novos conhecimentos e vivencias e nos induz a comportamentos dos mais inadequados.

Viajar com preconcepções atrapalha muito. Tento evitar, mas é difícil, uma vez que em função da carga de informações que a internet proporciona acabo partindo para uma nova viagem com um quadro formado na minha mente.

Tivemos bastante contato com os vietnamitas, uma vez que fizemos uma viagem “taylor made”.

Os guias eram pessoas doces, afáveis, super disponíveis.

Eram jovens e não tinham vivido a guerra, mas contavam muitas histórias dos pais e parentes.

Em momento nenhum mostraram algum rancor com relação a guerra ou aos americanos. Pelo contrário, mostravam um certo orgulho que só os vencedores têem…

Em Hanoi, ficamos hospedados bem no centro da cidade e bastava sair do hotel e estar imerso no grande movimento dos mercados locais. Poderia passar horas e horas nestes mercados.

Os “live markets” são bastante interessantes e na Indochina ainda é possível comer as “street foods” sentados em banquetas na calçada.

Halong Bay, há algumas horas ao sul da cidade, foi explorada em dois dias a bordo de uma embarcação muito confortável onde os únicos passageiros éramos a minha família e uma outra família de Singapura.

Atravessamos paisagens incríveis e visitamos cavernas e povoados flutuantes.

Sempre envolto por uma névoa, comum nesta época do ano, dava um aspecto idílico ao entorno, que não queria mais acordar.

Nos dirigimos de trem para o norte do país para a região de Sa Pa, quase na fronteira com a China.

Depois de muito trem e muito carro ao longo de estradas montanhosas, chegamos nesta que é a região predominante da etnia “Hmong” entre outras.

Dizem que a região virou hoje um grande resort.

Não foi a experiência que tivemos. Encontramos povoados bastante autênticos envolvidos nas suas atividades do dia a dia na agricultura, nas enormes plantações de arroz e, muito surpreendente, no cultivo do cânhamo, ou seja, Cannabis Sativa, ou seja, maconha.

Mas não era a maconha o foco da atividade. O cânhamo é usado largamente na confecção, que é feita de forma artesanal pelas famílias e cooperativas e é comum o tingimento com o índigo, também cultivado na região. Então ao longo do “hiking” passamos por inúmeras casas que se dedicavam à esta lida.

Ainda no norte do país visitamos os povoados de Bac Ha e Can Cau durante as feiras semanais onde se comercializa de tudo inclusive búfalos, cavalos, bois e até cachorros para o abate e consumo.

Dava uma aflição ao ver ao redor das casas campesinas cachorros brincando com os donos e saber que estes animais não eram considerados “pets” e que logo logo, como as galinhas, também estariam na panela.

A última etapa desta viagem foi na região sul do país.

Iniciamos por Ho Chi Min, antiga Saigon que é uma cidade também bastante movimentada. Visitamos o pequeno museu voltado à guerra do Vietnã que apesar do tamanho foi extremamente interessante…vale muito a pena.

Outro passeio também nesta região foi a visita ao Campo Cu Chi onde pudemos ver um exemplo da engenhosidade dos vietnamitas na construção dos minúsculos tuneis para deslocamento subterrâneo ao longo de centenas de quilômetros. Tuneis estes impossíveis para mim, pois a abertura é menor que a largura do meu quadril, mas também pudera…olha o meu tamanho comparado ao biótipo vietnamita…

Outra coisa que divertiu meus filhos foi a possibilidade de dar uns tiros com o fuzil AK-47, armamento símbolo da guerra do Vietnã.

Já partindo em direção ao Camboja visitamos o delta do rio Mekong a bordo de um barquinho motorizado.

Passamos por vilas e mais vilas observando o movimento do comercio, habitações e experimentando a deliciosa culinária vietnamita que para mim é das mais saborosas. Pernoitamos na cidade de Can Tho e no dia seguinte nos despedimos do Vietnã com o coração bem apertadinho.

 


Debora Patlajan Marcolin, médica, 62 anos, muito curiosa com relação a diversidade cultural do nosso planeta. Viajo desde que me conheço por gente e tudo me atrai. Desde a minha vizinhança pobre de Carapicuiba até as cerimonias fúnebres de Tana Toraja na Indonésia, passando por paraísos naturais como o pantanal mato-grossense e deserto do Jalapão. Já conheci por volta de 75 países e não paro de projetar novos destinos. Entendo que para se viajar é preciso estar de peito aberto e abandonar todo tipo de preconcepção, que com certeza, a viagem vai te provocar profundas mudanças internas e gosto pela vida. Autora do blog A Minha Viagem.

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